Fala ocorre em meio ao início do tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros. Lula afirmou ainda que não vai sobretaxar produtos norte-americanos em retaliação.
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Entrevista de Lula para a Reuters — Foto: Adriano Machado/Reuters |
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, em entrevista à agência de notícias Reuters, que só pretende ligar para o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, quando sentir que há disposição real para diálogo. Até lá, disse que não vai se humilhar.
“Pode ter certeza de uma coisa: o dia que a minha intuição me disser que o Trump está disposto a conversar, eu não terei dúvida de ligar para ele. Mas hoje a minha intuição diz que ele não quer conversar. E eu não vou me humilhar”, declarou Lula.
A fala acontece em meio à entrada em vigor do tarifaço de 50% anunciado pelo governo norte-americano, que afeta diversos produtos brasileiros. Apesar disso, Lula afirmou que não pretende retaliar com tarifas sobre produtos dos EUA, para evitar uma escalada de conflitos e também não impactar negativamente a inflação no Brasil.
“Não vou fazer, porque eu não quero ter o mesmo comportamento dele. Quero mostrar que, quando um não quer, dois não brigam. Eu não quero brigar com os EUA”, afirmou.
Exceções e impacto
A medida americana não atinge todos os produtos. Há uma longa lista de exceções, como:
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Suco de laranja
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Aeronaves civis
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Petróleo
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Veículos e peças
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Fertilizantes
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Produtos energéticos
Por outro lado, produtos importantes para o Brasil, como carne e café, foram afetados diretamente.
Lula responsabiliza visão unilateral de Trump
Ao ser questionado se a relação entre Brasil e EUA vive hoje o pior momento dos últimos 200 anos, Lula negou, mas apontou a causa do conflito:
“Vamos colocar as coisas do jeito que elas aconteceram. O presidente Trump, categoricamente e publicamente, é contra o multilateralismo. Ele prefere o unilateralismo. Prefere negociar país com país, em vez de negociar por meio da OMC [Organização Mundial do Comércio].”
Apesar do descrédito com a atual força da OMC, o Brasil acionou formalmente a organização nesta quarta-feira, dando início ao processo de consultas com os EUA, etapa inicial de um possível painel arbitral. Segundo o governo brasileiro, embora a chance de sucesso seja pequena, o gesto reforça o compromisso do país com as regras multilaterais.
Debate no BRICS
Lula afirmou que pretende discutir o tarifaço no âmbito do BRICS — grupo que reúne países como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — que também têm sido alvos de tarifas dos EUA.
"Vou tentar fazer uma discussão com eles [Brics] sobre como é que cada um está dentro da situação, qual é a implicação que tem em cada país, para a gente poder tomar uma decisão", explicou.
Ele também lembrou que dez países do BRICS fazem parte do G20, o que amplia a capacidade do bloco de articular uma resposta coordenada no cenário internacional.
"Ataque à soberania"
Um dos motivos apontados por Trump para impor as tarifas ao Brasil seria o processo judicial envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, seu aliado político. Segundo Trump, o processo é uma "caça às bruxas", embora siga todos os trâmites legais no país.
“Não é uma intromissão pequena, é o presidente da República dos EUA achando que pode ditar regras a um país soberano como o Brasil", criticou Lula.
O presidente brasileiro também denunciou tentativas de interferência norte-americana sobre decisões do Congresso Nacional, especialmente no que diz respeito à regulamentação das big techs — as grandes empresas de tecnologia dos EUA.
"O Brasil é um país soberano e, assim como os Estados Unidos, tem o direito de estabelecer regras para o funcionamento de empresas que atuam no seu território", completou.